Wednesday, January 30, 2008

o diabo está nos detalhes



pra fechar o mes de janeiro e a série “onde esta a arquitetura norte-americana?”, começo hoje a partir de um ótimo texto de Martin Filler na New York Review chamado “Miracle on the Bowery”.

nele o autor se derrete de elogios ao New Museum de Kazuyo Sejima, sem contudo deixar de concordar com minhas modestas observações de que a tão declamada luz natural não exerce o efeito esperado nos espaços internos. Mas Filler acerta no alvo quando comenta que “a globalização na arquitetura é tão profunda que vale perguntar se arquitetos estrangeiros não teriam uma vantagem em relação aos talentos locais”. Na análise de Filler, alguns arquitetos seriam intimamente ligados aos processos locais de construção e por isso não se dão bem no exterior, enquanto outros brilham mais intensamente em terras alheias.

tudo dependeria da forma como detalhes e especificações são desenhados e entendidos, daí minha crítica aos projetos recentes de nosso gênio maior, Oscar Niemeyer. Depois que o século 20 materializou em edifícios todas as formas e geometrias possíveis, a genialidade reside muito mais no detalhe que no todo.

e é justamente nesse ponto que discordo quando Filler diz que a Morgan Library de Renzo Piano é decepcionante pois para mim foi o projeto mais sensível, mais elegante a mais bem executado que ví em New York na virada do ano.

trata-se de um edifício encrustado no meio de 3 outros prédios de propriedade de um financista bilionário, Pierpont Morgan, e seu filho J.P. Morgan. Como todo bom magnata, os Morgans foram comprando arte e manuscritos raros enquanto enriquecia, e deixou uma coleçao impressionante de Van Goghs, Degas, Matisses, bíblias originais de Guttemberg e cartas de Leonardo da Vinci, entre outros tesouros menos famosos, com ênfase na renascença italiana.

anteriormente, a coleçao se espalhava por 3 edifícios, a casa, o escritório e a casa de hóspedes. Renzo Piano foi contratado para projetar uma expansão que unificasse o conjunto e no melhor estilo tardo-moderno, desenhou um edifício que é pequeno por fora e grande por dentro. Ao respeitar os volumes originais e recuar seu anexo em relação à rua, Piano conseguiu um edifício discreto mas extremamente generoso e espaçoso, cuja presença se faz marcante depois da entrada e não antes. O auditório naturalmente enterrado abre espaço para um luminoso átrio/café logo depois da entrada, com elevadores de pistão articulando os 4 pavimentos, 2 acima e 2 abaixo do terreno natural. O uso de vidro é extenso, e serve não só para captar luz natural (aqui sim, marcante e rasgadamente presente) mas também para revelar os edifícios originais na sua integridade.

de certa forma a Morgan Library de Piano é a antítese do New Museum de Sejima, muito mais impressionante por dentro que por fora, apesar de que a elegância de Piano já se anuncia do outro lado da rua.

e lamento muito ter sido proibido de fotografar porque o melhor de sua arquitetura, assim como se diz do diabo, está nos detalhes.

Sunday, January 27, 2008

ainda sobre a crítica


enquanto alencastro diz que Ciro Pirondi se recusa a criticar Oscar Niemeyer e Montaner pôe o dedo na ferida dizendo que os críticos brasileiros deveriam ser mais, adivinhem!, críticos, a revista IstoÉ desta semana pôe mais lenha na fogueira que anda queimando, imagino que com certa razão, os últimos edifícios do mestre centenário em Brasília.

este modesto blogueiro acha que Oscar merece bastante respeito, e que Pirondi presta um desfavor à profissão ao se recusar a criticá-lo. Crítica não significa necessariamente desrespeito, muito pelo contrario. pode e deve ser bastante respeitosa.

agora o ponto central, na minha opinião, passou liso pela crítica da IstoÉ e tambem pela do New York Times: a qualidade dos profissionais (leia-se familiares) que hoje compõem o escritório Niemeyer. Já foi-se o tempo em que arquitetos do quilate de Filgueiras Lima ou Milton Ribeiro detalhavam as curvas riscadas pelo pincel pilot do mestre. Fiquei estarecido com a baixa qualidade da exposição que esteve em BH em julho passado e acho que andou por todo o país. Imagens pixeladas de um 3D tão primário que faz sketch-up parecer o máximo da sofisticação.

Niemeyer merecia melhor.

Friday, January 25, 2008

a dança da chuva


pobre São Pedro, deve estar bastante confuso e indeciso sobre o que fazer com as chuvas no Brasil.

metade da população, a metade mais sofrida e excluída reza todo dia para não chover porque sabe que as encostas vão descer ou a várzea vai ser alagada, e de uma forma ou de outra os barracos vão se encher de água, estragando os poucos pertences cujas prestações ainda estão por vencer.

a outra metade, a parte inserida e empregada, reza todo dia para que chova mais de forma a manter alto o nível dos reservatórios e baixo o preço da energia, evitando possíveis racionamentos de energia elétrica ou mesmo de gás no caso das termelétricas terem de funcionar a todo vapor.

enquanto isso, como escreveu tão bem Marcelo Camelo, vai chover, de novo deu na tv, que o povo já se cansou, de tanto o céu desabar, e pede a um santo daqui, que reze ajuda....

Tuesday, January 22, 2008

200 anos de “independência”


passou batido hoje pela versão online dos grandes jornais brasileiros (me digam se havia alguma notinha numa página lá no meio) o bicentenário da data em que o Brasil deixou oficialmente de ser uma colônia portuguesa.


em 22 de janeiro de 1808, o rei João VI e sua corte aportava em Salvador, transformando o território americano do sul em sede do reino, pouco depois oficialmente elevado a Reino Unido do Brasil, Portugal e Algarve.

tudo bem que nosso processo de idependência foi assim meio enviesgado, um imperador filho do outro rei, o nosso primeiro e depois o quarto de portugal.

mas que merecia pelo menos um debate ou uma análise nesse aniversário de 200 anos, isso merecia.

e cá entre nós, não é impressionante pensar que Oscar Niemeyer viveu mais da metade da vida soberana desse país?

Sunday, January 20, 2008

do excesso à falta





com bastante estadarlhaço na mídia especializada e em todos os “cadernos de cultura” dos jornais, foi inaugurado em dezembro o New Museum of Contemporary Arts, em New York, projeto de SANAA, o escritório de Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa.

Sejima é uma das minhas favoritas na atualidade, não só por ser uma das poucas mulheres nesse tremendo clube-do-bolinha da arquitetura internacional, mas por ter uma sensibilidade extraordinária. Seu edifício de apartamentos em Gifu Kitagata é uma obra-prima (já escreví isso).

no caso do New Museum, vale dizer que a insercao urbana é fantástica, uma das melhores volumetrias que eu ví nos últimos tempos. De uma simplicidade franciscana, o edifício se faz a partir de 6 caixas empilhadas, cada uma ligeiramente deslocada em relação a inferior. Nem uma diagonal, nem um grito formalista, apenas deslocamentos ortogonalmente rigorosos criando uma sensação de movimento na fachada, parece mesmo que os volumes vão se mexer a qualquer momento.

ironicamente localizado na Bowery avenue, região que congrega centenas de lojas de luminárias e equipamentos elétricos, o New Museum deveria (notar o futuro do pretérito) ser um espaço dominado pela idéia da luz.

tudo parece ter sido feito para que a luz fosse protagonista principal. O revestimento externo é todo em chapa cortada formando uma tela branca (mas reflexiva, algo como um alumínio bem claro) que uniformiza e quebra um pouco a luz. E os deslocamentos entre os 6 volumes cria diversas oportunidades para a luz penetrar de maneira marcante os espaços de exposição internos.

mas de dentro o predio é no mínimo estranho e para muitos, se mostrou frustrante mesmo. Na estrada, uma curva feita da mesma tela do exterior (parece ser apenas uma versão menor do mesmo corte) envolve a livraria e empurra o visitante, suavemente, para os elevadores. Sobe-se ao último andar para que se possa visitar as salas de exposição descendo escadas.

aí começam as contradições e frustrações. As salas se expandem e contraem, ora oferecendo espaços nobres e generosos, ora espremendo e forçando a circulacao pelo que deveria ser uma escada secundaria, de incendio ou serviço. Eu até que achei as contrações espaciais bem interessantes, mas a maioria das escadas foi totalmente removida de qualquer contato visual com as salas (legislação de incêndio, talvez?) e a ruptura é inevitável. Interrompe-se a fruição e é como se estivéssimos em um prédio adaptado para o uso do museu.

a arte lá exposta também não ajuda. Isso de atravessar uma lâmpada fluoressente por um sofá velho e dizer que é uma reflexão sobre o sexo na sociedade contemporânea não em pega. No final, Deborah cronometrou a visita: levamos exatos 16 minutos para descer os 6 andares e olha que éramos 4 arquitetos e mais 2 familiares conversando animadamente sobre o edifício.

é certo que o prédio foi feito com um orçamento muito apertado, mas o piso estava já todo trincado com apenas 2 semanas de uso. Ouví depois que Sejima propositadamente não quis usar juntas de dilatação mas para quê? Que tipo de radicalidade é essa? Olhando para cima, o forro em tela branca é barata mesmo, tudo absolutamente exposto (ok) mas a imprssão deixada é que não houve nenhum investimento em detalhes.

e finalmente a luz, a grande promessa do edifício. Na primeira visita era de noite (horário em que o museu espera receber a maioria dos visitantes) e então nada de jogo de luz natural. Mas não me dei por vencido e voltei lá durante o dia. Mesmo assim a luz nao me impressionou. Talvez num dia de sol tenhamos sobras fortes nos rasgos como nos livros de Tadao Ando, mas num dia nublado do inverno novaiorquino a luz natural não me emocionou nem um pouco e todo o discurso celebratório da crítica me pareceu inflado.

ah, vale a pena falar que os banheiros sao geniais, umas pastilhas laranjas elaboradamente compostas fazendo um trabalho de superfície a-la-Herzog+DeMeuron.

seria isso uma provocacao de Sejima, as galerias apressadas e mal acabadas e um banheiro super detalhado e exuberante? Ao contrário do 40 Bond que celebra o excesso, o New Museum faz como que a apologia da falta, do crú, do osso.

Friday, January 18, 2008

ainda em defesa da crítica

sabe quando algo te incomoda e você não sabe exatamente o que nem porque.

pois é, ontem eu fiquei bastante incomodado com o post do Alencastro em que ele ou ela (o blog é anônimo) apontavam as alfinetadas de Montaner aos críticos brasileiros.

hoje eu pude ler a entrevista inteira, graças a gentileza da entrevistadora, Bianca Antunes, que me mandou o texto completo. E se por um lado gostei muito da entrevista, acho que gostei mais das perguntas que das respostas. Dois momentos de destaque: quando Montaner explica porque a sustentabilidade é um problema contemporâneo fundamental (basicamente porque a ciência evoliu) e quando ele chama atenção para a questão da habitação. Mas não custa repetir, as perguntas já eram boas, as respostas foram até fáceis.

mas incômodo mesmo foi ler a justificativa de Montaner para a não inclusão de vários críticos latino-americanos no seu último livro: ninguém ia conhecer (?!).

um momento, cara-pálida! Se você acredita que Alberto Arai(mexicano citado por Montaner) tem valor e não é conhecido, não seria esta uma razão a mais para incluí-lo e contribuir, ainda que modestamente, para torná-lo conhecido? Se você mesmo diz que o mundo da teoria está dominado por anglo-americanos e europeus (o que eu chamaria cinicamente de “Circuito Cultural OTAN”), porque fazer o mesmo jogo? Porque insistir naquilo que se sabe viciado e etnocêntrico?

desconhecer a crítica latino-americana alegando ignorância ou barreira linguística (sorry me no read portuguese) já seria triste, fazê-lo em sã consciência então.....

para nós, brasucas, fica a velha lição: façamos nós mesmos a nossa defesa (e a nossa autocrítica) porque usar espelho estrangeiro as vezes causa muitas distorções e tantos mais sustos

Thursday, January 17, 2008

em defesa da crítica



ainda não recebí a AU de janeiro (demora umas 3 semanas para chegar na biblioteca aqui, que assina só para um único leitor) mas não posso deixar de registrar meu estranhamento com relação às críticas de Josep M. Montaner que nos foram apontadas pelo Blog do Alencastro.

segundo Montaner, os críticos brasileiros seriam muito bons de ensaios e textos curtos mas falham em não produzir livros de maior fôlego em que teorias mais abrangentes seriam propostas em profundidade.

o que na minha opinião é menos um problema dos críticos em sí e muito mais do mercado editorial brasileiro. Comparar nossas pequenas editoras com gigantes como Gustavo Gilli por exemplo é maldade. Ainda não conhecí ninguem que tenha conseguido fazer dos livros um bom negócio no Brasil. Escrevemos porque amamos o ofício e no final das contas acabamos todos pagando para publicar quando se computa o total de horas investidas versus o retorno financeiro. Ruth e Hugo são, na minha opinião, heróis por conseguirem publicar livros com regularidade.

e quem edita tambem sofre com uma rede de distribuição precária e predatória ao mesmo tempo. Tiro meu chapéu para as duplas Abílio Guerra e Silvana Romano; e Sylvio Podestá e Gaby Aragão que literalmente carregam livros nas costas para distribuir pelo país a fora e no final ficar no zero a zero financeiro.

aos poucos o cenário parace ir melhorando e se temos hoje mais de 100 escolas de arquitetura, algo de positivo tinha de acontecer como consequência desta expansão descontrolada.

mas nosso pequeno mercado em português não vai nunca se equiparar ao mercado em espanhol.

por isso Montaner, acho que sua bem-intencionada crítica precisa ser revista pelo viés econômico, por mais que nós arquitetos estajamos já infelizmente nos acostumando a trabalhar de graça.

Monday, January 14, 2008

ainda 40 Bond




não há como passar incólume na frente de um edifício desses, 40 Bond parece despertar reações até nos mais distraídos.

moda passageira ou tendência processual, as superfícies customizadas via computador estão na minha opinião só começando. Interessante seria observar se vão continuar sendo um revestimento luxuoso ou se vão se incorporar de vez no processo de desenho e construção.

mas hoje de manhã recebi um e-mail de uma colega em NY, Rachel Villalta que me deixou ainda mais intrigado. Duas semanas atrás nós conversávamos justamente sobre este edifício e o que ele representa, e Rachel resolveu investigar mais de perto. Com olhos de arquiteta brasileira e norte-americana ao mesmo tempo, ela descobriu esta planta no site promocional do prédio.

para surpresa de Rachel e agora minha também, esta unidade 9A (das maiores e mais caras) tem duas portas de acesso, o que é raríssimo por aqui em apartamentos. O que é ainda comum no Brasil e em outras regiões de similar desigualdade (diga-se de passagem, desaparecenco aos poucos) é tido como desperdício de área por aqui e quase sempre interpretado, corretamente, como marca de preconceito arraigado no espaço construído.

em defesa de Herzog e De Meuron cabe dizer que ambas as portas levam à sala principal e não à cozinha ou à área-de-serviço,aqui substituída por máquinas no utility closet que se vê no corredor.

por que então duas portas? Uma para o ir e vir do dia a dia, e outra para impressionar as visitas com a grandiosa “entrance gallery”?

complexo, e para mim cada vez mais alinhado com a sociedade do excesso , da exuberância e da contradição que caracteriza tão bem este início de século XXI.

obrigado Rachel pelo achado, global apartments agradece.

Friday, January 11, 2008

my name is bond, 40 bond



a rua na região conhecida como NoHo (north of Houston) é despretenciosa, prédios relativamente baixos (7, 8 pavimentos) com escritórios e residências intercalados.


de repente uma surpresa.


o número 40 da Bond Street se destaca ao longe pelo verde da fachada, brilhante, translúcido, refletindo o sol baixo do inverno novaiorquino, meio fraco mesmo em meio-dia de céu limpo.

a organização é absolutamente regular, o ritmo da fachada não se altera, segue de certa forma as aberturas verticais da arquitetura local quando as paredes ainda eram portantes. Os primeiros pavimentos bem no alinhamento, depois um recuo-jardim e outros 3 pavimentos seguindo exatamente o mesmo ritmo 3 metros atrás. O edifício é até bastante horizontal e provavelmente ocupa 2 ou 3 lotes.

no encontro com a rua, o ritmo regular das colunas e vigas verdes (revestidas em vidro curvo!) dá lugar a um recuo meio que sextavado para criar um pequeno atrio para as lojas. Brilhante, literal e metaforicamente. Neste recuo das lojas o revestimento é metálico, reflexivo e texturizado em alto-relevo, continuando também no corredor central que dá acesso ao hall e aos apartamentos nos andares superiores.

mas a grande surpresa mesmo fica por conta do rendilhado em ferro fundido que serve de grade e portão antes das lojas, fazendo também o papel de embasamento da caixa superior.

e aí reside a grande força do edifício: o exagero, o excesso, o rendilhado, os brilhantes. Por cima de uma lógica geométrica simples e rigorosa coloca-se o elaborado (deveria até dizer decorado) recobrimento dos revestimentos. Alto-relevos, rendilhados em ferro fundido, calhas de vidro verde curvo.

Herzog + de Meuron tem trabalhado texturas e revestimentos a décadas: a caixinha de sinalização ferroviária em lâminas de cobre; o museu em San Francisco, o estádio olímpico de Beijing que vamos ver à exaustão ainda este ano; são todos produtos diretos na capacidade de se cortar e construir exatamente aquilo que se desenha vetorialmente em CAD, mais comumente chamado de digital fabrication. Esta escola de rendas e bordados tem ganhado bastante espaço e parece ter vindo para ficar.

mas por outro lado o excesso e o exagero lembra muito o art-nouveau e a arquitetura dos anos 20 que não coincidentemente foi uma época de expansão acelerada do capitalismo especulativo, de crescente desigualdade e de uma burgesia exuberante. O resultado daquela vez foi o crash de 1929 e o nacionalismo exacerbado dos anos 30 que desabou em guerra generalizada.

apesar disso, uma parte significativa da arquitetura parece ter embarcado na onda da elaboração digital cuja tradução direta via CNC Routers e Laser Cutters está na raiz deste preocupante exagero.
e enquanto seu lobo não vem ninguem faz melhor que Herzog + de Meuron.

Tuesday, January 8, 2008

escola suiça de bordado e rendas



esta semana ainda vou escrever sobre 40 Bond, o novíssimo e exuberante edifício de Herzog + De Meuron em New York.

mas hoje eu faço um post só para argumentar que os suíços sensação do momento (e cá entre nós, com razão) estão começando a fazer escola.

olha só o projeto de Wojciech Kakowski, Natalia Paszkowska e Marcin Mostafa para o pavilhão polonês na feira mundial de Shanghai, 2010.

Sunday, January 6, 2008

Gehry sem inspiração



dando sequência à série “cadê a arquitetura norte-americana?”, resolvi falar primeiro do novo edifício de Frank Gehry na rua 18 com 11ª avenida, bem na margem do rio Hudson.


trata-se de um edifício de 8 andares apenas, o que em Manhattan não é muito (se bem que Renzo Piano construíu uma jóia de 3 andares, assunto de um post no futuro breve). Apesar de não ser muito alto, o edifício se faz perceber de longe pela horizontalidade predominante nos piers e pela brancura que brilha de longe.


e o melhor do prédio parece estar aí, visto de longe suas curvas brancas e brilhantes de destacam do escuro padrão de tijolo dos galpões e apartamentos em volta. E as curvas, marca registrada de Gehry, são lindas de longe, ajudando a fazer do edifício uma novidade, uma relativa surpresa.


mas de perto o prédio não se relaciona bem com a rua, surgindo bruscamente do passeio já com seus vidros branqueados. As curvas que de longe pareciam tão diferente, de perto ficam meio que repetitivas. Na verdade, depois da primeira impressão, o edifício não é muito inspirador. Num exercício de “what if”, fiquei imaginando que se não fosse pelas curvas (e os vidros curvos são mesmo deslumbrantes) o prédio ficaria igualzinho àqueles predinhos de vidro recortado dos anos 70, com a fachada zigue-zaguando monótonamente de um lado pro outro.


o certo é que Gehry me parece mesmo dar ênfase exagerada à manipulação formal, em detrimento de outras questões compositivas como relação com a rua, coroamento, detalhes de caixilharia (tantas vezes se vê a massa plástica resolvendo as quinas). Seu processo de projeto incial, com bloquinhos de madeira ou papelão, fica evidente em um edifício como este de NY. O que faz falta é o Gehry dos anos 70 com suas inversões tectônicas, usando materiais menos nobres e expondo as entranhas do processo construtivo. Parece que Frank Gehry perdeu a garra, ficou tudo muito fácil com o software CATIA customizado para suas cascas curvas (casca mesmo, superfície externa de revestimento) e os orçamentos já de antemão esperando as firulas volumétricas.


um pouquinho mais de desafio não ia fazer mal a Frank Gehry não, quem sabe depois do MIT vem coisa nova por aí?

Wednesday, January 2, 2008

cadê a arquitetura norte-americana ?

graças ao trabalho da Letícia junto a ONU nos últimos meses eu tive a chance de vir várias vezes a New York, agora no final do ano por um período de quase 20 dias.

então, parafraseando o doutor Lúcio, deu pra ver muita construção e alguma arquitetura. Não com a voracidade com que meu parceiro Humberto atacou a cidade (de sol a sol o que significa das 9 da manhã `as 5 da tarde no inverno aqui) mas devagarinho, gole por gole como quem toma um single malt. Mas a companhia do Humberto foi fundamental para as reflexões que inauguro agora e que devem ocupar as primeiras semanas de janeiro a fora.

e pra começar a série “cadê a arquitetura norte-americana?” nada melhor do que partir da própria pergunta. Acontece que nessas tantas andanças por Manhattan e Brooklyn, fui enfileirando uma série de edifícios recentes que, como bons arquitetos e professores de arquitetura, não poderíamos perder: O New Museum de Kasuo Sejima; Jean Nouvel no Soho, Herzog & De Meuron em 40 Bond St; NYTimes tower e Morgan library de Renzo Piano; a torre contraventada do Foster e o prédio de Gehry na 18th com Hudson River.

deu pra perceber a razão da pergunta que dá título a este post? com Gehry sendo a excessão que comprova a regra (canadense de nascimento apesar de viver em Los Angeles por mais de 40 anos), todos os outros são estrangeiros.

depois de um boom nos anos 70 e 80 com Eisenman, Meyer, Graves e cia, ainda não surgiu uma geração de arquitetos norte-americanos capaz de substituir os “whites” e os “grays”. Talvez Phillip Johnson esteja fazendo muuuita falta e sem seu poder lobístico os norte-americanos não estejam conseguindo se equiparar aos colegas vindos do outro lado dos oceanos Atlântico e Pacífico.

ou talvez a resposta esteja num artigo de Michael Speaks de 10 anos atrás em que ele percebia uma diferença gritante entre a vanguarda norte-americana obcecada com a manipulação da forma e suas geometrias elaboradas; e a vanguarda européia mais preocupada com a performance dos edifícios e as transformações no próprio processo de desenho e construção que as novas tecnologias estavam trazendo.

me parece também que depois de 20 anos enfurnados em investigações conceituais e abstratas (aquilo que se chamou “critical discourse”) a arquitetura norte-americana passa agora por um vazio de liderança, uma desorientação, uma falta de rumo.

como um cachorro que caiu da mudança, não adianta voltar para a casa velha (os blobs e manipulações geométricas com base no desenho) nem sabe be monde fica a casa nova (o neo-pragmatismo de raiz modernista e vies sustentável).

então esse blog se propõe a procurar o pobre cachorro perdido.

começaremos por NY e seus fantásticos arquitetos estrangeiros (Sejima, Piano, Herzog & De Meuron) para depois discutirmos a nova geração yankee (atenção aos sobrenomes): Teddy Cruz; Monica Ponce de Leon + Nader Tehrani (office DA); Sunil Bald + Yolande Daniels (studio sumo); Andrew Zago.

o ano começa quente no inverno daqui