Monday, April 30, 2007

duas bolas la dentro




interrompo as conversas de arquitetura para falar de futebol, o que nas belas palavras de Eduardo Galeano é a coisa mais importante do mundo depois das coisas realmente importantes. Mas o fato é que o futebol volta e meia nos trás cenas fantásticas como essa de um goleiro que caminhava tristemente para tirar a bola do terceiro gol do Glorioso de dentro da sua meta e nem percebeu que o jogo recomeçara e lá vinha a bola do quarto gol. Salto alto eu já vi de todo tipo mas esse bateu todos os recordes. E contra quem foi é muito, mas muito mais bonito. Veja no orkut.






Thursday, April 19, 2007

educando o cliente


Hoje tiro meu chapéu para Thom Mayne - Morphosis.
Ao visitar o novo prédio da Federal Court the Eugene, Oregon, um fato me chamou a atenção desde o inicio e não foram as elegantes superfícies curvas em metal nem a graciosa escada transparente. O que me surpreendeu logo de inicio foi o fato de que o juiz chefe, honorable Michael Hogan viria conversar com o grupo de arquitetos sobre o prédio. Fiquei intrigado logo de cara com o fato de um chief judge (equivalente ao um magistrado presidente do tribunal de justiça no Brasil) se dar ao trabalho de vir nos recepcionar. Mais surpreso ainda fiquei quando o juiz começou a falar dos conceitos de transparência de democracia no judiciário e de que maneira estas idéias estavam materializadas no projeto de Thom Mayne. Com citações sobre Romchamp e La Villete, o juiz foi nos levando a entender a planta do edifício a partir das salas do júri e da importância do judiciário na democracia enquanto explicava cada relação espacial e decisão sobre materiais, visadas, eixos e etc, com um vocabulário melhor que a grande maioria dos nossos graduados em arquitetura. Não resisti e perguntei se ele tinha tido contato prévio com a disciplina, talvez um pai arquiteto ou esposa ou filho. Não, respondeu o juiz chefe, tudo que aprendi sobre arquitetura aprendi no processo de projetar e construir este edifício aqui. Não acreditei muito e reservadamente perguntei à arquiteta contratada pelo fórum. Ela confirmou que não apenas o juiz não sabia muito de arquitetura como resistiu ao projeto de Mayne que havia vencido a concorrência fechada feita pela administração federal. O juiz no principio queria um edifício tradicional, retangular e com fachada de pedra, como um pastiche das antigas courthouses do século 19. Foi Thom Mayne quem instigou o juiz a pensar qual o conceito de justiça o edifício deveria expressar e ao longo de vários jantares em Eugene e Los Angeles foi aos poucos educando o magistrado nos valores da arquitetura. Claro que Mayne foi extremamente hábil ao captar o ego do juiz chefe para o projeto, mas o resultado foi um edifício extremamente funcional e de altíssimo valor simbólico. A propósito, o prédio foi construído dentro do orçamento e do prazo originalmente estabelecidos.

Sunday, April 15, 2007

Geopolítica verde

a Revista do New York Times de hoje tem como matéria de capa um artigo de Thomas Friedman sobre sustentabilidade e geopolítica em que ele afirma que a única maneira dos EUA resgatarem seu papel de liderança mundial é abraçarem a causa verde, diminuírem sua dependência de petróleo (vide Venezuela, Iran, Nigéria e o pesadelo iraquiano) e mudarem a forma como constroem e gerenciam suas cidades.
Publico esta pequena nota para iniciar uma conversa aqui nesse blog.
Quais a oportunidades para o Brasil nesse cenário?
Já temos nossa matriz energética fortemente baseada em fontes renováveis, do etanol às hidroelétricas. Falta lidar melhor com a água, recurso abundante mas que pode vir a complicar nosso desenvolvimento futuro seja pela falta seja pela extrema abundância nas enchentes de verão. Prometo escrever mais sobre o tema na medida em que for colocando material novo no site do Studio Toró.
Mas meus caros amigos arquitetos, qual o nosso papel nisso tudo? Qual a função da arquitetura nessa nova ordem mundial do aquecimento e do explosivo mercado “verde” que vem por ai?

Monday, April 9, 2007

Sol LeWitt (1928-2007)




















Em 2001 uma exposição no museu de arte contemporânea de Chicago me abriu os olhos para o fato de que a expressão e a significação podem vir de geometras absolutamente simples e regulares. Vinhamos todos os arquitetos (eu incluso, lá pelos idos de 92, 93) de uma década de volumes quebrados e ângulos pontudos, certos de que a emoção era sinônimo de dinamismo e diagonais. Pois nao é que a obra rigorosa de Sol Le Witt nos faz ver que muito antes pelo contrário, a beleza reside tanto na surpresa quanto na regularidade. Mais ainda, passada a surpresa, resta a tranquila beleza da simplicidade.

Sunday, April 8, 2007

Indice de comparação de apartamentos

Nosso grupo de pesquisa sobre os “global apartments” (comparação entre soluções habitacionais de varias cidades do mundo) nós acabamos de divulgar uma primeira versão de um índice destinado a tornar possível a comparação entre apartamnetos de diferentes cidades baseado em duas variáveis principais: níveis de integração e relação entre preço e poder de compra.

Para a variável integração nós usamos um cálculo simples de profundidade tomado de empréstimo da Sintaxe Espacial (mean depth) em que quanto mais alto o número (mais profundo) mais o apartamento é segregado; e quanto mais baixo maior a integração. No gráfico aqui publicado, quanto mais a esquerda mais integrado, quanto mais a direita mais segregado. Isso nos dá uma idéia de isolamento e individualismo versus congregação e uso comum dos espaços.

Em termos de “affordability” ou relação entre preço e poder de compra decidimos usar um mais cálculo mais controverso que não leva em conta apenas o custo mas também a renda disponivel. A maioria das pessoas diriam que Tóquio e Londres estão entre as cidades mais caras em termos de habitação, mas se consideramos este custo em relação aos salários medianos em ambos os lugares, não é bem assim. Para poder comparar o custo da habitação em cidades tão dispares quanto Seoul, Moscow e o Rio (cujos apartamentos contemporâneos são extremamente parecidos) dividimos o preço de cada um dos nossos exemplos pela renda media da populacao. Isso nos dá uma idéia de quantos anos uma família media teria que trabalhar para pagar por tal unidade. Há de se notar que usando estes cálculo apartamentos no Rio de Janeiro podem ser comparativamente mais caros que apartamentos em Seoul. Também há de se notar no gráfico que qualquer razão acima do valor 10 significa que a unidade é impagável para uma família de renda media já que por um financiamento de 30 anos tal família gastaria mais de 30% de sua renda mesmo se a taxa de juros for zero. Na realidade, qualquer razão acima de 8 neste índice é “unaffordable” dada uma taxa de juros de baixo risco tipo financiamento imobiliário.

Tuesday, April 3, 2007

Gordon Matta-Clark

acabei de voltar de NY onde uma exposição no Whitney Museum sobre a obra de Gordon Matta-Clark me deixou emocionado. Gordon, pra quem não conhece era filho do pintor surrealista chileno Matta, cresceu em New York e estudou arquitetura em Cornell. Pra todos os efeitos Gordon detestou a escola de arquitetura mas a arquitetura continuou dentro dele pra sempre. No final dos anos 60 ele começou uma serie de intervenções (algumas ilegais) em edifícios abandonados ou prestes a serem demolidos. Munido de uma serra elétrica e outros instrumentos de corte, Gordon abria buracos, cortava pedaços, arrancava blocos de paredes e pisos e ao fazê-lo expunha as entranhas de um edifício. Há algo de aula de anatomia nas intervenções de Gordon Matta-Clark, como num Rembrandt ou num Leonardo. E são tantas as lições contidas nas peças que Gordon guardou consigo, pedaços inteiros de casas e prédios que expostos em uma galeria fazem uma ode à materialidade, esta tão sofrida e surrada componente arquitetural. Outra quase homenagem aos intestinos e esqueletos da arquitetura são suas fascinantes montagens fotográficas em que o edifício depois de retalhado é recomposto pela sobreposição de fotos em ângulos diversos cuja perspectiva distorcida é em si uma aula de múltiplas experiências arquitetônicas. Mas pra mim o melhor de toda a exposição foi aprender que quando convidado pelo IAUS (instituto fundado por Peter Eisenman e outros) para fazer uma instalação, Gordon levou fotos de edifícios dilapidados no Bronx, quebrou todas as janelas da sala reservada a exposição e explicou: a arquitetura de vocês é idêntica a esta outra das áreas pobres e abandonadas de NY, a diferença é um vidro novo aqui e outro vidro quebrado lá. Os mestres do IAUS não deram conta de lidar com tamanha verdade, censuraram a obra de Gordon e consertaram as vidraças. Nunca o amor pela arquitetura chegou a ser tão visceral quanto na obra de Gordon Matta-Clark, que dizia odiar arquitetura.